segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

A Chinelada da Ultrapar

No final de 2017 ninguém imaginaria Ultrapar (UGPA3) sendo negociada abaixo de R$ 60,00. Afinal, essa empresa tinha um longuíssimo histórico de crescimento, com sua receita se elevando exponencialmente.  Mas os sinais de saturação já estavam lá, com seu gráfico formando não mais uma reta ascendente, mas uma parábola.

Toda empresa de crescimento carrega no seu preço um ágio, um prêmio, devido a sua característica principal, que se mantém enquanto ela se mantiver em crescimento. O problema surge quando a empresa sai de uma fase de crescimento e para uma fase de estabilidade. Seus indicadores se mantêm excelentes, tudo parece como antes, lucro elevando, ROE satisfatório, dívidas sobre controle, mas os preços começam a cair, numa aparente irracionalidade do mercado. É que falta algo que passa despercebido para muitos: a variável “g”. G de growth rate, a taxa de crescimento. Sem a perspectiva de crescimento o ágio no preço tende a desaparecer e ocorre a derrocada.

Esse mesmo fenômeno atingiu em 2018 a Cielo, mas na Ultrapar houve algumas explicações mais convincentes: greve dos caminhoneiros e a expectativa da chegada dos carros elétricos. Mas, o fato é que a Ultrapar chegou num ponto de saturação, não há como continuar crescendo num ritmo acelerado dentro do mercado em que atua. Uma solução encontrada foi entrar em outros mercados  (farmácias), mas tal estratégia até agora não deu o resultado esperado e começa a afetar negativamente os resultados (a Extrafarma teve prejuízo de R$ 27 milhões em 3T18).

Por curiosidade, o Fluxo de Caixa Descontado da UGPA3 em dezembro de 2017 já mostrava um valor justo de R$ 61,35, bem abaixo da cotação de R$ 74,21 no dia 28/12/2017. Hoje, o FCD aponta um valor justo de apenas R$ 49,87, e mesmo assim graças à normalização dos lucros (desconsiderando o prejuízo causado pela greve dos caminhoneiros) e admitindo um crescimento anual de 5%, um desempenho que a empresa não exibe desde meados de 2016. Será que Ultrapar vai conseguir se recuperar em 2019?

Gráfico abaixo semanal em escala logarítmica.

14 comentários:

Diego R. disse...

Gostei dessa abordagem mais sensata sobre precificação aó contrário do mantra que as vezes vemos em outros lugares que aportes mensais no LP não fazem diferença.

Paulo Vieira disse...

Diogo R. Eu acredito que devemos seguir os bons exemplos, de quem conseguiu ter sucesso. E 10 entre cada 10 investidores de sucesso souberam, de alguma forma, avaliar o ativo para então compra-lo por um preço justo.

Unknown disse...

Paulo Boa noite !

Vi alguns comentários seus bem maduros no clube FII. Gostaria de saber de você , que já possui uma ampla experiencias com FII's e Ações, por onde um investidor "iniciante" deve focar os estudos para tomar decisões 'certas' para o longo prazo (Aposentadoria) ? Estou um pouco perdido em relação onde e quando investir visando longo prazo.

(Comecei a investir em FII's mês passado, e procuro aportar em algumas ações também.)

Muito Obrigado !

Abs,

Paulo Vieira disse...

@Leonardo Fittipaldi vamos lá: eu já cometi muitos erros e tirei algumas lições. O primeiro é vc focar na base de tudo, que é o emocional: é não ser ansioso, não ter inveja, nem medo. O principal inimigo do investidor de longo prazo é o emocional. Ele vê uma pessoa no infomoney dizendo que ganhou 100% no último ano, vê seu desempenho e chega a conclusão que está fazendo tudo errado. Só que essa pessoa que ganhou 100% agora, amanhã pode perder 50% e sair no prejuízo. Para investir no longo prazo precisa ter um ótimo emocional, saber não se estressar por pouco.

Segundo é se apoiar em quem sabe, não inventar a roda. Evite quem diga que vai te ensinar a ganhar R$ 1 mihão em pouco tempo investindo pouco. Quem é sério não vai vender tais ilusões. É muito difícil identificar essas pessoas com quem se pode aprender, mas geralmente elas se apoiam nos grandes mestres, elas tentam traduzir algo já testado, não inventar formulas mágicas.

Terceiro: conheça suas limitações. Eu demorei anos para aprender a fazer valuation, não fiz contabilidade. Muitos nunca conseguirão entender contabilidade. Mas, felizmente, existem outras fórmulas bastantes simples que valem a pena serem estudadas. Mas, se tem capacidade de compreender contabilidade, invista nisso. Do contrário, aprenda o feijão com arroz, que é o suficiente. Conhecendo suas limitações, vc pode fazer uma programação de estudos. Estudar é fundamental para ter sucesso em renda variável.

Para quem está começando como vc, pense em dividir os recursos em renda fixa (fundo de emergência), FII e ações. Renda Fixa e FII tem um risco relativamente reduzido, é difícil cometer um erro grave. Em ações, o melhor é comprar aquilo que é consenso. Por exemplo, ITSA, é um consenso geral que ITSA é uma boa ação. Para quem é iniciante, o ideal é evitar small caps ou mesmo as famosas carteiras recomendadas (porque essas recomendações não são de longo prazo, são quase sempre de curto-prazo). Procure aquilo que possui um longo histórico de bons resultados: uma empresa que dá lucro há 50 anos, dificilmente dará prejuízo nos próximos 5 anos. Começe pelo que tem baixo risco, como as eletricas, bancos, seguros, locação de veículos, aquilo que não é ciclíco, que não corra risco de obsolescência, que tenha um crescimento estável, não acelerado, que vc possa comprar e dormir tranquilo.

Unknown disse...

Paulo, fiquei super feliz por suas recomendações. Gosto muito do mercado financeiro e é cada vez mais difícil achar pessoas igual você. Possuo algumas duvidas, e se você estivesse disposto a responder ficaria muito grato.

1- Nesse exemplo que das te, mencionou que dificilmente dará prejuízo nos próximos 5 anos ... Mas para mim que demorara mais de 25 anos para me aposentar (Mais ou menos), como devo investir ? 'Rotacionar' a carteira durante alguns períodos? O que você recomendaria?

2- Estou ainda muito perdido em relação a quantidade gigantesca de Ações e FII's que a bolsa possui, como você começou a achar oportunidades? Foi pesquisando as mais faladas?

3- Quando você não 'acha' nenhuma oportunidade no momento para investir, onde deixa o dinheiro? Em Tesouro Selic? CDB com liquidação diaria?

4 - Como que você faz a analise de preço 'justo' para a compra daquele ativo? Você faz isso toda vez que ira investir? teria alguns conteúdos sobre para eu me aprofundar mais ?

Muito Obrigado !

Abs

Carlos S. disse...

Paulo/Ocaba,

Você não tem interesse em fazer um grupo de telegram/whatsapp (Ocaba é por causa de ábaco? Só me toquei agora!) para falar sobre ações e FIIs?

Seu conhecimento é bastante evidente, sua didática é boa e você expõe seus argumentos muito bem. Não digo para indicar ativos, mas suas exposições certamente ajudariam (como já ajudam) muitos iniciantes (como eu) e intermediários.

Enfim, pense com carinho nisso, por favor. E obrigado por suas exposições.

Abs
Carlos/charlietea

Paulo Vieira disse...

@Leonardo Fittipaldi , 1: 25 anos é um bom tempo. Então, com certeza, a carteira que vc iniciar agora não será a mesma daqui a 25 anos. Porque algumas vão desaparecer, fechar o capital, virar abacaxi, etc. O processo de renovação da carteira ocorre naturalmente. Não existe um momento para se renovar.

2: existem muitas técnicas de seleção de carteiras. Como eu montei a minha: primeiro restringi a busca a apenas empresas que fazem parte do índice Ibovespa. Segundo: descartei setores que possuem problemas de sustentabilidade, como aviação, planos de fidelidade, construção.Terceiro: exclui o que não tem sustentabilidade (uma Eternit, Souza Cruz) ou que esteja em setores em processo de consolidação, que tenha problemas de governança. Por fim, pelos indicadores econômicos: pelo menos 5 anos de lucro e um ROE acima de 10%. No segundo momento, posso escolher visando ter uma diversificação setorial, incluindo ações fora do Ibovespa. Um exemplo foi IRBR3, que foi escolhida pelo setor de seguros. UNIP3 eu adquiri porque se tornou uma opção para a BRKM, que ficou cara (também foi setorial).

3: Deixo parado em fundo de renda fixa, dá menos problema, quando uso corretora de banco. Meu foco não é renda fixa, a diferença entre tesouro SELIC e Fundo de Renda Fixa é mínima. No caso de corretora normal, deixo parado em FII de papel com alta liquidez ou Tesouro SELIC se não há opções.

4: A precificação eu faço com ajuda de gráficos e fluxo de caixa descontado - FCD. O gráfico, inclusive, entra no processo de seleção (nesse caso da Ultrapar, ele indica saturação). Utilizo 3 planilhas básicas de FCD (fluxo da firma, do acionista e por dividendos). Vou usar o preço definido a partir da convergência de 3 ou 2 planilhas. Se todos os 3 modelos divergirem, tenho uma 4ª planilha para desempate. O preço obtido não pode divergir muito do mercado e as vezes faço um teste pegando um dado passado para ver se tem aderência. Ou seja, esse é um processo bastante complicado. Depois de feito uma primeira vez, torna-se algo quase automático: numa próxima precificação, basta atualiza a planilha. Atualmente uso Damodaran: http://pages.stern.nyu.edu/~adamodar/. A explicação em portugues para a planilha baseada em dividendos está na Página do SER: http://www.fundamentus.com.br/pagina_do_ser/excel.htm. Está um pouco desatualizada. Esse vídeo da Suno ajuda a usa-la: https://www.youtube.com/watch?v=sI8e1MkkgqQ&t=1361s. As outras planilhas já são por experiência. Um modelo mais simples, que não uso, é baseado em na fórmula de Graham (https://www.youtube.com/watch?v=xdgV2RHtKNQ), que acho muito simplificada, e há ainda modelos super simplificados que vc encontra no youtube. O valor de compra tem um desconto sobre esse preço justo, entre 10% a 15%.

Paulo Vieira disse...

@Carlos S. é algo a se pensar. Eu resolvi escrever de novo no blog porque aqui é algo onda dá para se fazer um pensamento mais estruturado. Lá no ClubeFII fiz dezenas de estudos, a maioria demando horas de pesquisa, e simplesmente não acho mais o que escrevi. Então, o blog parece ser um bom lugar para se colocar determinados estudos. Mas sou uma pessoa muito acessível, quem quiser me mandar whatsapp é só enviar pelo (27) 99971-9190. Já criar um grupo é algo pode ser feito no futuro, se eu conseguir me organizar.

WilsonDM disse...

Prezado Paulo,

meu nome é Wilson, sou iniciante no FII.
Achei seus comentários no ClubeFII muito interessantes, vc tá há anos-luz de conhecimento...
Comprei R$ 10 mil GGRC11 a R$ 125, e tem me dado retornos de 0 88% ao mês, o que pra mim tem sido excelente.
Agora soube que haverá oportunidade de subscrições de cerca de 50% da carteira.
Me pareceu, por alguns comentários, q vc tem algumas restrições a essa emissão (na verdade não entendi qual o problema).
Onde posso buscar orientação que vc considera confiável sobre essa questão?
Se vc estivesse interessado na renda desse papel, a longo prazo, vc faria essa subscrição?

Paulo Vieira disse...

@WilsonDM, não tenho restrições a respeito da subscrição de GGRC11, pelo contrário, eu disse que sempre ganhei nas subscrições em que entrei. Mas nem todas as subscrições são vantasojas ao investidor. Por exemplo, FFCI teve várias subscrições, entrei em todas onde o valor da subscrição era bem inferior ao preço de mercado. Já as subrscrições que estavam com preço próximo ou superior ao de mercado, preferi não entrar. No final, a subscrição será boa para o investidor se o fundo aplicar devidamente o dinheiro, de preferência, já ter um imóvel definido para comprar. As subscrições que dão errado para o investidor são justamente aqueleas que são feitas só por fazer e o dinheiro, ficando depois parado na renda fixa. Acho que não é o caso dessa subscrição de GGRC, pois o gestor tem um excelente histórico e deve agregar ao fundo. Tanto, que parei de vender as cotas que tinha para participar desta subscrição.

WilsonDM disse...

Prezado Paulo,
obrigado pela sua pronta resposta, é bom conhecer sua experiência com subscrições, fico mais tranquilo.
Quando comprei a GGRC11, tinha um preço teto de compra estimado em R$128.
Esse preço teto poderia ser usado como referência tbm no momento da subscrição?
Hoje a ação tá mais de R$134, o que daria boa folga pra fazer a subscrição a R$116(?), certo?

Paulo Vieira disse...

@WilsonDM, vc pode usar esse preço como referência, pois, em tese, não haverá queda nos proventos. Pelo menos, é o que se espera de uma subscrição, que os proventos se mantenham ou subam. O preço da subscrição poderia ser maior, mas o gestor claramente precisa que a subscrição seja um sucesso, por isso colocou um preço atraente.

WilsonDM disse...

Obrigado pela pronta resposta, Paulo.
Eu tenho uma outra dúvida - sem querer abusar da sua boa vontade - que diz respeito ao "desinvestimento"... olha só, eu dei uma sorte danada e uma ação que eu comprei para dividendos valorizou quase 20% (líquido do IR) em cerca de 40 dias. Pelas minhas contas, isso representa mais de dois anos de dividendos.
Eu deveria/poderia realizar esse "lucro" e investir em outro ativo, ou deveria ignorar e manter o meu foco original em dividendos?

Paulo Vieira disse...

@WilsonDM, o ideal é vc ter um valuation recente desta ação. Se o preço atual estiver, digamos, 25% acima do valor, a não ser que exista uma excepcionalidade (por exemplo, um processo de privatização) não faz muito sentido manter algo que é negociado muito acima do valor, a não ser que não exista nenhuma outra opção. Então não é uma decisão fácil , pois depende de um valuation, de não ter exepcionalidades e de ter outras opções. Eu, pessoalmente, mesmo numa situação que atenda todos os requisitos citados, não vendo tudo. Geralmente, vendo uma parcela e depois reavalio e vendo mais uma parcela, para não perder a tendência