domingo, 9 de agosto de 2020

Brincando com fogo

 A redução nesta semana da SELIC em 25 pontos era algo já aguardado. A surpresa veio com a nota, afirmando que há espaço para novaS reduçõeS. Isso implica que em duas novas quedas, uma em setembro, quando a SELIC passará para 1,75% e outra até o final do ano, com a SELIC fechando em 1,5%. Consequentemente, 2021 começarão com o DI valendo 1,4% ao ano.

O mercado não recebeu bem o comunicado e passou a considerar que o governo está preocupado apenas com o aspecto fiscal (dívida pública), desprezando o monetário (inflação). O resultado é que a parte curta da curva de juros (curtíssimo prazo) caiu, para se ajustar as novas previsões da SELIC, e a parte longa disparou para cima (adicionando risco). O resultado foi uma elevação drástica na inclinação da curva de juros.

 Outra consequência foi o aumento firme do dólar. No mercado, se comenta que o dólar a R$ 5,50 está barato e o valor justo estaria próximo dos R$ 6,00. Esta alta do dólar joga pressão nos custos e nos preços do atacado, evitando uma deflação, por enquanto, nos IGPs. Já o varejo continua sem a possibilidade de repassar os preços para o consumidor final (e por isso o IPCA continua baixo).

As taxas de financiamento dos bancos, que são baseados nas taxas de LP, devem continuar elevadas, dificultando ainda mais a vida das empresas. Essa situação tende a provocar uma nova onda de quebra de empresas, reduzindo a oferta e permitindo o aumento de preços no varejo. Essa quebra generalizada também implicaria numa redução da arrecadação pelo governo. Por isso a urgência em criar um CPMF digital, visto que Amazon, Spotify, Apple, estão imunes as agruras das empresas brasileiras.

A alta dos DIs se refletiu nos cupons, mas não com a mesma intensidade. Em parte porque o mercado está buscando proteção nos ativos indexados pela inflação. Todavia, se a estratégia do governo, focada no fiscal, fracassar (não aprovação da CPMF ou da reforma tributária), a tendência é dos cupons dispararem (DI reflete inflação, cupom reflete risco fiscal).

Vale lembrar que ações, FIIs e até títulos públicos, viraram repositório da liquidez promovida pelo BC e estão inflacionados. Se algo der errado, essa inflação contida é transmitida para o resto da economia, podendo criar uma situação que obrigaria o BC a elevar rapidamente os juros para enxugar a liquidez. Isso poderia ser desastroso para nossa economia.


quinta-feira, 6 de agosto de 2020

COPOM: SELIC e os riscos inflacionários

Eu me preocupo com o fato do COPOM ter deixado a porta aberta para um novo corte dos juros em setembro.

Dizem que o objetivo é manter pressão sobre a curva de juros e reduzir a inclinação. Mas o efeito pode ser exatamente o contrário, com o mercado acreditando que o governo está subestimando os riscos inflacionários, já explícitos nos IGPs.

Além de toda aquela questão do delay da inflação, que começa na produção, passa pelo atacado e demora a chegar no varejo, com cada setor funcionando como um amortecedor, existe também um problema de metodologia. O grupo transporte é o principal componente do IPCA, com 20,8%. Só as passagens aéreas caíram 60%, e ninguém está usando avião. Sem essa queda nas passagens aéreas, a inflação de junho seria de 0,37% (0,11 pontos a mais). Desconsidera a deflação dos aplicativos de transporte e a inflação vai para 0,4% (0,03 pontos).

Essa abertura para novos cortes de juros vai pressionar o dólar, que por sua vez vai pressionar a inflação de custos, que vai pressionar a inflação no atacado, já bastante elevada. Ou o varejo repassa essa inflação para o consumidor ou vai quebrar.

Soma a tudo isso a clara ameaça de burlar o teto dos gastos públicos, na onda populista / desenvolvimentista / keynesiana do governo Bolsonaro, com risco de descontrole fiscal, e temos um cenário cada vez mais parecido com aquele que resultou na crise do governo Dilma.

Mercado de ativos está subindo sem fundamentos, baseado apenas numa inflação de ativos, causada por um movimento de rotation (pessoas físicas trocando RF por RV). Os estrangeiros, esses já retiram R$ 85 bilhões da bolsa neste ano.

Por enquanto, a festa vai continuar. Ações, FIIs, ouro, vai tudo subir. E junto subirão os riscos. É surfar a onda antes que ela quebre.

domingo, 2 de agosto de 2020

A disparidade entre os IGPs e o IPCA

Sobre a disparidade existente entre os índices de inflação, é preciso entender que o IGP mede principalmente o atacado, e o IPCA o varejo. Digamos que ninguém esteja mentindo, o que esses índices mostram? Que o varejo ou está queimando estoque ou reduziu sua margem de tal forma que está absorvendo a inflação do atacado. Provavelmente seja um misto dos dois, com o varejo acreditando que a alta do atacado é passageira. Se o varejo estiver certo, em algum momento os fornecedores serão obrigados a baixar seus preços, visto que também estão sendo afetados pela falta de demanda. Então, num futuro próximo, poderíamos ver uma deflação nos IGPs.

Problema: os preços dos fornecedores dependem do dólar. Enquanto não houver uma queda firme do dólar, não há como reduzir os preços. Mas o dólar nas últimas semanas tem se mantido estável, então, os preços no atacado também deveriam se manter estáveis. Só que os IGPs mostram que a alta dos preços continua.  Isso porque provavelmente os fornecedores no passado recente também tiveram que queimar estoques e reduzir margens. Contudo, agora estão sendo obrigados a renovar seus insumos, alguns dolarizados, e por isso passam a subir os preços para não terem prejuízo.
Ou seja, a transmissão da alta do dólar que ocorreu ao longo dos últimos meses não se deu de uma forma imediata, mas em etapas, sendo amortizada pelos diversos segmentos da economia. A recessão fez que essa transferência de custos fosse ainda mais lenta, devido à falta de demanda.

Eu, no momento, acredito que o dólar deva ceder um pouco nos próximos meses, permitindo uma desaceleração nos preços no atacado e numa leve acomodação dos preços no varejo. Mas mesmo essa leve acomodação tem um poder inflacionário. Se isso não ocorrer, vamos ter uma quebradeira no varejo (além da que já ocorreu), reduzindo a oferta e permitindo uma elevação dos preços. De qualquer forma nos próximos meses vai ocorrer um amplo ajuste (ofertaxdemandaxpreço). Somado ao descontrole fiscal, podemos ter um cenário sombrio.

Mas, os ativos, as ações, os FIIs, estes são beneficiados pela inflação de ativos e continuam com um céu de brigadeiro (por enquanto).

domingo, 25 de agosto de 2019

SUZB3 23/08/2019: tendência de baixa

Papel Suzano (SUZB3) sobre com um pivot de baixa. Seu objetivo inicial está na casa dos R$ 25,00.

Trata-se de um ativo que geralmente caminha contra a bolsa, geralmente atrelada ao dólar, em função de seu endividamento e por ser uma exportadora. Mas, fazendo o seu Fluxo de Caixa Descontado, pode-se perceber que seu preço atual ainda é elevado, confirmando a noção passada pelo gráfico (click no gráfico para melhor visualizar). A empresa teve prejuízo no primeiro trimestre de 2019 e lucro no segundo, em função das variações das despesas financeiras.



sábado, 24 de agosto de 2019

Se você comprar ativo restrito a IQ, o Leão vai te pegar !!!



Tem um vídeo na internet, de um “educador financeiro” de youtube, argumentando que quem compra cotas de Fundo Imobiliário destinado a Investidores Qualificados, poderá ter problemas com a Receita Federal. Isso não é verdade! Tais ativos tem a sua negociação, em ambiente de bolsa, restrita aos Investidores Qualificados, ou seja, aqueles que se declaram possuidores de mais de R$ 1 milhão investidos no mercado financeiro.  Todavia não é proibido ter a posse desses ativos. Desde que o investidor não tenha assinado um termo declarando ter mais de R$ 1 milhão investido, sem o ter, não estará cometendo qualquer irregularidade. Aqui, a falha é da corretora que permitiu a compra.

Então, se não é possível comprar um ativo restrito, como uma pessoa que não é classificada como IQ pode ter tal ativo? De várias formas: via herança, via doação, via transação fora do ambiente de bolsa. Por exemplo, os clientes do banco Itaú podem comprar qualquer dos fundos da Kinea, sem necessitar de qualquer comprovação ou declaração. A grande maioria das corretoras não possui qualquer filtro impedindo a compra de FIIs restritos para IQs por investidores comuns. O máximo que poderá ocorrer é, no momento de vender, o ter de fazê-lo via mesa de operações, caso o HB venha finalmente a programar tais operações. Mas o investidor não perderá o ativo, nem estará cometendo qualquer irregularidade.

Então, cuidado com as afirmações embasadas em suposições. Não existe risco algum de alguém ser pego pela Receita Federal porque está investindo em ativos destinados a IQ. Isso que está sendo divulgado é pura desinformação.

sábado, 20 de abril de 2019

Cielo e as formas correta e erradas de se analisar um ativo

Aqui está um vídeo que serve de exemplo de como se analisar uma ação. Existem diversas metodologias de análises, desde gráficos a fluxo de caixa descontado, passando pelas forças de Porter, análise de SWOT, desenho de cenários, etc. Todas essas metodologias possuem um ponto em comum: elas tentam projetar o futuro da empresa. Pode-se até observar o passado do ativo, mas o que interessa é o futuro. E é isso que esse vídeo mostra.



Em como não se analisar um ativo? Aqui, seis maneiras equivocadas, muito difundidas atualmente em sites e canais:

1 - Análise de retrovisor: Não adianta 241 anos de lucro, de múltiplos fabulosos, o que interessa é o futuro;

2 - Analise de Avestruz: muito do futuro de uma empresa é dita pelos seus administradores e pelos administradoras de suas concorrentes. Então, ler as notícias relevantes é fundamental. Não adianta fazer análise de balanço (passado) apenas uma vez por ano e depois enfiar a cabeça num buraco achando que nada de importante vai acontecer nos próximos 12 meses. Vivemos numa sociedade dinâmica. É verdade que existe um excesso de informações e cabe ao investidor filtrar o que é relevante. Mas, se o investidor é não possui tal capacidade, não será fingindo que nada está acontecendo que se vai resolver. Quem não tem essa capacidade que procure um profissional, um consultor ou analista de mercado, mas não se comporte como um avestruz;

3 - Fantasia de sócio: o fato de ter ações de uma empresa não significa que tem o mesmo poder dos sócios controlados. Estes podem ver a empresa como um negócio secundário, passível de ser sacrificado para o bem do negócio principal, no qual o investidor não tem ações. Basta ver o que aconteceu recentemente com a Smiles. Não pense que tendo 0,0001% da empresa já pode se achar o todo poderoso;

4 - Análise do apaixonado: paixão está associado a irracionalidade. É incrível como a paixão pode cegar uma pessoa. Ela passa a ignorar tudo e reage com irritação a quem lhe tenta mostrar a realidade. O investidor que cria paixão por uma empresa não aceita visões críticas e se apega a diversas desculpas para negar a realidade: que é investimento de longo prazo, que é holder, que o ativo representa pouco na sua carteira;

5 - Análise do esperto: a ação já caiu 30%. Não dá para cair mais, é a hora de quem foi paciente comprar. Mas a derrocada continua e a queda chega a 50%. Agora quem realmente for realmente esperto vai comprar e se vangloriar. Agora não tem erro. O investidor acredita que é mais esperto que todo o mercado, mas a ação continua caindo. O mercado adora punir os espertos;

6 - Análise do arrogante: Fluxo de Caixa é besteira, valor justo não existe, preço não importa, gráficos é para otários, vender é para os fracos, realizar lucro é burrice, ler notícias é perca de tempo, trimestral não muda nada, estudar pra quê?

Por fim, há os que acreditam que basta usar o Super System Indicator que vai dizer o que comprar (mas não diz quando vender), o sistema infalível (para o dono, que recebe uma grana dos investidos que acreditam na bola de cristal cibernética)

domingo, 17 de março de 2019

A Bettina é uma fraude?


Mercado em alta e eis que aparece a grande vencedora. A estrela da Empiricus conta no youtube que, em 3 anos, ganhou R$ 1 milhão a partir de, apenas, R$ 1.520,00. Isso dá ou 65.689% no período. Ela tem 22 anos, ainda cursando a faculdade e nenhuma experiência anterior com bolsa. É um desempenho sensacional, de colocar no chinelo todos os grandes mestres. É algo tão fantástico que muitos se perguntam: é verdade ou não passa de fraude?

A pergunta é, pode-se ganhar R$ 1 milhão em 3 anos a partir de R$ 1.520,00? Sim, é possível.  Da mesma forma que uma pessoa pode ganhar R$ 1 milhão na loteria depois de apostar R$ 1.520,00. Na bolsa isso seria possível através da compra de derivativos. Uma opção de compra pode subir 100% numa única tarde. O problema é que um pequeno descuido do investidor e essa opção vira pó. No final, trata-se de um jogo de soma zero. Então, a possibilidade de uma pessoa ganhar R$ 1 milhão no mercado de derivativos a partir  de um valor insignificante é praticamente zero, ou a mesma possibilidade de se ganhar na loteria.

Bem, mas Bettina já disse numa entrevista ao Money Times que fez fortuna aplicando numa carteira diversificada de ações. Aí fica difícil de acreditar. Digamos que Bettina seja uma investidora muito mais sortuda que qualquer outro mestre e consiga a façanha de obter um rendimento mensal de 2%. Isso daria 26,8% ao ano e 104% em 3 anos, muito distante dos 65.689%. Para se ter uma ideia, ela teria que obter 770% ao ano ou 19,75% ao mês para conseguir o seu milhão.

Mas, nessa mesma entrevista, ela explicou que R$ 1.520,00 foi apenas a primeira compra. Houve outros aportes. Considerando que seu desempenho foi de uma rentabilidade de 2% ao mês, algo espetacular, esses aportes mensais deveriam ser de R$ 19.797,00, o que só poderia ser possível para uma pessoa muito bem de vida. De fato, Bettina é muito bem de vida, é de uma família rica, possui 3 empresas e já trabalhou como modelo. Mesmo assim, ainda é difícil de acreditar que, apenas com seus ganhos, tivesse quase R$ 20 mil para aplicar todos os meses.

Então, qual o segredo de Bettina? Novamente, a entrevista ao Money Times revela o segredo. Além de aportes mensais, Bettina também aplicou as economias que acumulou desde os 15 anos. Lembrando, sua família é rica, proprietária diversas empresas no sul do Brasil, entre elas uma metalurgia, uma empresa de construções e uma participações (Grupo Rudolph). Então, como não se sabe exatamente qual foi a “poupança” empregada, fica impossível saber qual o verdadeiro desempenho de Bettina.

Mas, há uma dica: por que uma pessoa que aparentemente consegue um desempenho fabuloso na bolsa, ainda cursando o ensino superior, iria optar por se tornar funcionária de uma casa de análises? Se ela ganhava, digamos 10% ao mês, isso daria hoje R$ 100 mil/mês. Nem de longe uma corretora pagaria isso a uma funcionária recém-formada, sem CNPI. Mais, como funcionária, ela não pode investir em ações, apenas ETFs e fundo de ações, que rendem algo próximo ao índice Bovespa. Se seu desempenho fosse bem mais modesto, uns de 50% ao ano, em apenas 5 anos seu ganho mensal seria de R$ 260.947,44. Não faz sentido deixar tudo para ser uma reles funcionaria de casa de análise.

A verdade é que o rendimento de Bettina deve ser muito inferior ao que tenta transparecer e, provavelmente, turbinado pela casa de análise. É sabido que toda ação sobe quando recebe uma recomendação e cai quando essa é retirada. Se um investidor consegue essa informação de forma antecipada, antes do mercado, ele pode turbinar os seus ganhos. Sem isso, mesmo aplicado nas recomendações, dificilmente se teria um desempenho excepcional, pois o mercado reage com gaps às indicações.

Então, voltando a pergunta inicial, a Bettina é uma fraude? Não, porque R$ 1.520,00 foi a compra inicial. Não sabemos qual foi o aporte posterior, nem como foi seu relacionamento com a Empiricus. O que ela aportou pode ter sido R$ 1.520,00 ou R$ 750.000,00. Omitir não é fraude, mas é ético? Definitivamente, não é uma ação ética da Empiricus. O que está se vendendo é algo impossível, mesmo para o melhor investidor. As autoridades deveriam atuar neste caso, mas parece que a Empiricus deve se sentir muito bem protegida para continuar insistindo nessa campanha.

domingo, 20 de janeiro de 2019

Duratex: céu ou inferno?


A Duratex (DTEX3) é uma empresa produtora de painéis de madeira e acessórios para banheiro e cozinha. É a maior em seu segmento no Brasil. Ela existe desde 1962 e é controlada pela Itausa. Estando intimamente liga ao setor de construção, pode ser considerada uma empresa cíclica e foi duramente afetada pela recente crise econômica. Com a possiblidade de recuperação do setor de construção a partir de 2019, a Duratex poderia ser uma boa opção para quem não quer investir em ações de construtoras. Só que....

O gráfico de longo prazo (abaixo) mostra que a ação não ultrapassa a resistência dos R$ 11,00 desde 2007. Ao longo de 11 anos essa resistência foi testada diversas vezes, sem ser superada.  Mas, finalmente, no final de 2018, essa barreira foi superada e hoje a ação já está em R$ 13,05. Portanto o gráfico de longo prazo mostra que é o momento certo para se comprar DTEX3 e aproveitar a recuperação do setor de construção. Mas existe um pequeno problema que não aparece no gráfico.

A Duratex apesar de ser uma empresa sólida, de grande tradição, nunca se notabilizou por dar um bom retorno ao acionista. Seus indicadores sempre foram fracos. O ROE é baixo, girando nos últimos anos na casa dos 4% e o DY estava em 1,4% no início de 2018. O preço/lucro geralmente se mantinha acima de 20 nos últimos anos e o lucro nunca foi expressivo. Pelos indicadores, não é uma empresa atraente.

Mais eis que em meados de 2018 a empresa vendeu algumas terras e florestas  para a Suzano Papel e Celulose, gerando um não recorrente de R$ 360 milhões,  dobrando o lucro da empresa. Com esse não recorrente a empresa pode elevar os proventos de R$ 0,0971 (JCP e dividendos em 2017), para R$ 0,73 por ação (DY de 5,6%). Mas, basta subtrair o não recorrente para se perceber que a empresa continua com indicadores fracos.

Usando o Fluxo de Caixa Descontado, o preço justo atual de DTEX3 não passa dos R$ 10,00, confirmando a fraqueza dos indicadores. Isso, mesmo considerando um crescimento acelerado nos próximos anos. Tal fato nos leva a seguinte situação: acreditar nos gráficos que mostram que a ação finalmente poderá deslanchar, saindo de um marasmo que durou uma década? Ou se render a fraqueza de seus números e considerar que essa empresa não é a melhor opção para quem quer investir pensando no longo prazo?





domingo, 13 de janeiro de 2019

Questão de liquidez



No mercado de FIIs, a imensa maioria se define como investidores de longo prazo. Muitos desses adotam a estratégia de Buy&Hold. Portanto, são investidores que não pretendem vender seus papeis por qualquer motivo. Então, por que motivo liquidez é considerado como um importante fator por esses investidores?

Liquidez é a facilidade, ou dificuldade, de se adquirir ou desfazer de um ativo. Geralmente depende da quantidade de investidores que estão negociando o ativo e de sua concentração nestes. Por exemplo, podemos ter um fundo com 3 milhões de cotas, mas, destas, 2,9 milhões foram adquiridos por fundos de pensão e de investimentos, restando apenas 100 mil cotas em poder de pequenos investidores pessoa física. Se os fundos não quiserem abrir mão de suas cotas, a liquidez será determinada pelos pequenos investidores. Como consequência, serão poucas as negociações mensais, tornando difícil a compra e venda do ativo.

Outra consequência da baixa liquidez é o spread elevado.  No mercado de renda variável, spread é a diferença entre as melhores ofertas de compra e venda de um mesmo ativo. Um ativo de alta liquidez terá um spread muito baixo, na casa dos centavos. Já num ativo de baixa liquidez, o spread pode ser superior a 5% do valor do preço. Pior, podem sequer existir ofertas de compra ou de venda.

Bem, até aqui parece que comprar um ativo sem liquidez não é um bom negócio. Existe uma crença que bons ativos possuem uma liquidez elevada, pois sempre existirão pessoas interessadas em comprar esses ativos. Isso não é verdade. Basta ver que ações que possuem as modalidades ON e PN: mesmo que a ação ON seja considerada superior, por melhor proteger o acionista, e receber os mesmos dividendos, seu preço poderá ser inferior a PN e não possuir uma boa liquidez. A PN, por ser mais liquida, exibirá o que se denomina “prêmio de liquidez”, um preço mais elevado pelo simples fato de ser mais liquida.

Mas, a importância dada por alguns investidores de longo prazo a questão da liquidez é algo contraditório. Seja no Buy&Hold, ou no Value Investing, a liquidez não é um fator importante. Espera-se que tais investidores sejam pessoas pacientes, capazes de não se importar em ficar com um ativo durante anos. Então, por que o desespero com a dificuldade de comprar ou vender um ativo? Comprar um fundo como o RDPD11 ou o FVPQ11 pode ser um exercício de paciência, uma ordem por um preço justo pode demorar meses para ser executada, mas, desde que se esteja num preço justo, ela em algum momento será executada.

Mas, e se eu precisar de dinheiro? E se eu precisar vender? Bem, neste caso, então, não se trata de investimento de longo prazo. Talvez a melhor definição de investimento de longo prazo seja: aquilo que não tem prazo. Por exemplo, se o recurso usado no investimento destina-se no final a adquirir, depois de 3 anos, um imóvel, o fato de ter um prazo definido já o inviabiliza como investimento de longo prazo. Se para o investidor existe a necessidade, em algum momento, de sair rapidamente de um ativo, ele deveria reavaliar se se enquadra ou não como investidor de longo prazo.

Mas, imprevistos podem ocorrer e a necessidade de vender pode surgir. Para essas situações espera-se que o investidor saiba gerir a sua carteira. Não se espera que 100% dos seus investimentos estejam em ativos sem liquidez. No mínimo, deveria ter uma reserva de emergência.  Mas, caso ocorra uma situação extrema, a eventual perda deveria ser considerada como normal. Uma pessoa que aplica num CDB de 5 anos, se depois de 1 ano precisar do dinheiro, será punida com uma perda parcial dos rendimentos. É algo que se aceita ao se contratar um CDB. Se a pessoa é dona de um apartamento e, por um motivo qualquer, precisar vender com rapidez, ela terá que colocar pedir um preço muito abaixo do mercado para concretizar rapidamente a venda. E nessas situações, nem a liquidez salva. Por exemplo, quem comprou BBDC4 em meados de 2015, por R$ 27, e no inicio de 2016 precisasse do dinheiro, teria que vender por R$ 18, com perda de 1/3 do valor investido.

Outro argumento usado é a dificuldade de se colocar ordens ”até cancelar” nas corretoras. Algumas exigem que o valor da ordem esteja depositado na conta, outras cobram por ordens parciais. Nestes casos, o melhor é simplesmente trocar de corretora. Muitas já disponibilizam crédito aos seus correntistas, de forma que não é necessário permanecer com o dinheiro parado na conta. Outras possuem planos de corretagem que não cobram por ordens parciais. Algumas até isentam de corretagem a negociação com FIIs. Se você é um investidor de longo prazo, deveria procurar uma corretora que se adeque a sua forma de operar.

Por fim, quando a liquidez é importante? Em primeiro lugar, óbvio, quando existe uma grande possibilidade de se necessitar desses recursos investidos de forma imediata. Mas, neste caso, não será um investimento de longo prazo. Outra situação é a aplicação de determinados tipos de trades, como a venda a descoberto, o day-trade e estratégias de curto-prazo baseadas em gráficos. Aqui uma curiosidade: existem trades onde se deseja que os spreads sejam elevados. Típico caso são as pessoas que gostam de negociar imóveis, comprando-os de pessoas   desesperadas por dinheiro para depois revender num preço justo. Por sinal, as fortes oscilações de preço devido a baixa liquidez oferecem oportunidades para os investidores de valor adquirirem ativos com preços descontados.

Portanto, se você é um investidor de longo prazo, liquidez não deveria ser um problema. Acreditar que liquidez é sinônimo de ativo sólido é um equivoco. Basta lembrar o que aconteceu com Telemar, Paranapanema, OGX, Varig  e tantos outros que um dia já se destacaram pela sua liquidez. Mas, se ainda assim, você acredita que grau de liquidez é algo fundamental, então deveria refletir se seu perfil é de investidor de longo prazo.

segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

A Chinelada da Ultrapar

No final de 2017 ninguém imaginaria Ultrapar (UGPA3) sendo negociada abaixo de R$ 60,00. Afinal, essa empresa tinha um longuíssimo histórico de crescimento, com sua receita se elevando exponencialmente.  Mas os sinais de saturação já estavam lá, com seu gráfico formando não mais uma reta ascendente, mas uma parábola.

Toda empresa de crescimento carrega no seu preço um ágio, um prêmio, devido a sua característica principal, que se mantém enquanto ela se mantiver em crescimento. O problema surge quando a empresa sai de uma fase de crescimento e para uma fase de estabilidade. Seus indicadores se mantêm excelentes, tudo parece como antes, lucro elevando, ROE satisfatório, dívidas sobre controle, mas os preços começam a cair, numa aparente irracionalidade do mercado. É que falta algo que passa despercebido para muitos: a variável “g”. G de growth rate, a taxa de crescimento. Sem a perspectiva de crescimento o ágio no preço tende a desaparecer e ocorre a derrocada.

Esse mesmo fenômeno atingiu em 2018 a Cielo, mas na Ultrapar houve algumas explicações mais convincentes: greve dos caminhoneiros e a expectativa da chegada dos carros elétricos. Mas, o fato é que a Ultrapar chegou num ponto de saturação, não há como continuar crescendo num ritmo acelerado dentro do mercado em que atua. Uma solução encontrada foi entrar em outros mercados  (farmácias), mas tal estratégia até agora não deu o resultado esperado e começa a afetar negativamente os resultados (a Extrafarma teve prejuízo de R$ 27 milhões em 3T18).

Por curiosidade, o Fluxo de Caixa Descontado da UGPA3 em dezembro de 2017 já mostrava um valor justo de R$ 61,35, bem abaixo da cotação de R$ 74,21 no dia 28/12/2017. Hoje, o FCD aponta um valor justo de apenas R$ 49,87, e mesmo assim graças à normalização dos lucros (desconsiderando o prejuízo causado pela greve dos caminhoneiros) e admitindo um crescimento anual de 5%, um desempenho que a empresa não exibe desde meados de 2016. Será que Ultrapar vai conseguir se recuperar em 2019?

Gráfico abaixo semanal em escala logarítmica.

domingo, 30 de dezembro de 2018

Por que compramos ações?


Para quem quer ver como funcionava o conceito de margem de segurança, pregada por Ben Graham, basta ver o filme “Other People’s Money”. Nele, Larry é um investidor que compra empresas sem futuro, mas que ainda podem render um bom lucro se forem liquidadas. Um belo dia uma das empresas que monitora, uma fábrica de cabos e fios, fica com seu preço abaixo da margem de segurança e ele decide comprá-la. Aqui, margem de segurança é o preço com um percentual abaixo do valor de liquidação, o que garante o lucro ao liquida-la. Tal prática foi comum durante os anos 80 e era mal vista.

O climax do filme é a Assembleia Geral dos acionistas, que devem decidir qual o futuro da empresa. Andrew Jorgenson, o sócio-controlador, que anseia em salvar a empresa. Seu discurso é emocionante. Mas Larry usa a racionalidade e lembra aos acionistas o porquê de terem comprado ações. Segue os discursos:

Andrew Jorgenson – Sinto-me feliz por ver tantos rostos familiares e velhos amigos, alguns que já não via há anos. Obrigado por terem vindo. Nosso capacitado presidente relatou no relatório anual o que conseguimos fazer neste ano, a necessidade de outros avanços e nossas metas para o próximo ano e os que se seguirão. Quero conversar com vocês sobre outra coisa, expor algumas de minhas idéias relativas à votação para a direção da empresa que lhes pertence, esta empresa que sobreviveu à morte do seu fundador, a numerosas recessões, à Grande Depressão e a duas guerras mundiais: ela se encontra em perigo iminente de destruir-se, no dia de hoje, na cidade em que nasceu.

Ali está o instrumento de sua destruição. Contemplem-no, no auge de sua glória: Larry, o Liquidador, o empresário da América pós-industrial, fazendo-se Deus com dinheiro alheio. Os cruéis barões do passado, pelo menos, deixaram atrás certas coisas concretas: uma mina de carvão, uma estrada de ferro, bancos. Esse homem não deixa nada, não cria nada, nada constrói e nada dirige! No seu rastro não ficam senão montanhas de papel para ocultar as dores. Se ele dissesse: "Sei conduzir sua empresa melhor que você", haveria algo sobre o qual poderíamos conversar. Mas o que ele diz é "Vou matá-los porque neste momento vocês têm mais valor mortos do que vivos!"

Bem, talvez seja verdade, como também é verdade que um dia esta organização voltará a ter lucro, quando o iene se enfraquecer ou o dólar se fortalecer, ou quando, finalmente, começarmos a reconstruir as estradas, as pontes e a infra-estrutura do país. Os pedidos chegarão às nuvens! E quando isso acontecer ainda estaremos aqui, mais fortes por causa dos sofrimentos, mais fortes porque teremos sobrevivido. E aí o valor das nossas ações fará a oferta dele empalidecer.

Deus tenha pena de nós se resolvermos pegar os dólares e dar o fora. Deus tenha pena deste país se essa for a verdadeira onda do futuro. Porque aí o país nada produzirá além de hambúrgueres e advogados, e nada venderá além de paraísos fiscais. E se já estivermos no ponto de matar uma pessoa porque no momento ela vale mais morta do que viva, contemplem seus vizinhos: vocês não os matarão, não é? Não! O nome disso é assassinato, é coisa contra a lei. Pois isto aqui também é assassinato, em grande escala. Em Wall Street chamam-no "elevar ao máximo o valor das ações" e o consideram estar de acordo com a lei. E colocam notas de dólares onde deveria haver a consciência. Malditos! Uma empresa vale mais que o preço de suas ações. Nela ganhamos a vida, conhecemos nossos amigos, sonhamos nossos sonhos. E é, em todos os sentidos, a própria textura que mantém unida a nossa sociedade. Digamos então neste encontro, a todos os Garfields do país: aqui nós construímos coisas, não as destruímos. Aqui nós nos preocupamos com algo mais do que o preço das nossas ações: aqui nós nos preocupamos com as pessoas!

Larry Garfield – Amém e amém e amém! Desculpem-me por desconhecer os hábitos de vocês, mas na minha terra costumamos dizer amém depois das orações. Porque foi isso o que vocês ouviram: uma oração. Na minha terra, esse tipo de oração é chamada oração pelos mortos. Vocês acabam de ouvir uma oração pelos mortos, amigos acionistas, e não disseram amém. Esta empresa está morta. Eu não a matei, não me culpem. Ela já tinha morrido quando cheguei. É tarde demais para rezar, porque mesmo que a oração fosse atendida, se ocorresse um milagre, se com o iene acontecesse isto, com o dólar aquilo e com a infra-estrutura não-sei-o-que mais, ainda assim não adiantaria. Sabem por quê? Fibras ópticas. Novas tecnologias. Obsolescência. Nós já morremos! Nós quebramos. Sabem qual o melhor caminho para quebrar? Controlar uma parte cada vez maior de um mercado que afunda. Aí a gente entra pelo ralo, devagar e sempre. Já houve muitas fábricas de chicotes para cavalos. Acredito que a última delas fazia o melhor chicote que já se fabricou. E vocês gostariam de possuir ações dela? Investiriam num negócio e este negócio já estava morto. Tenhamos a inteligência, tenham a capacidade de assinar seu atestado de óbito, receber o seguro e investir em algo que tenha futuro!

"Ah, não podemos", diz o pregador. "Não podemos porque temos responsabilidades: responsabilidades com nossos empregados, com nossa comunidade. O que será deles?" Bastam estas palavras para responder: quem se importa? Vocês se importam com eles? Por que, se eles não se importaram com vocês? Eles pensam neles mesmos. Vocês não são responsáveis por eles, porque nos últimos dez anos esta empresa chupou o dinheiro de vocês. 

Essa comunidade já disse "São tempos difíceis, então vamos reduzamos os impostos e as tarifas públicas."? Verifiquem: vocês pagam duas vezes mais impostos do que há dez anos. E nossos dedicados empregados, que não têm aumento há três anos, ainda ganham o dobro do que ganhavam dez anos atrás – enquanto nossas ações valem uma sexta parte do que valiam na época... Vou dizer-lhes quem se importa com vocês: eu! Não sou seu melhor amigo, sou seu único amigo. Não crio nada: crio dinheiro para vocês. A não ser que vocês esqueçam que, em primeiro lugar, foi para isso que compraram ações. Vocês querem ganhar dinheiro, não querem saber se fabricam cabos e fios, frango frito ou doces de tangerinas. Querem ganhar dinheiro! Sou o único amigo que vocês têm, faço-os ganhar dinheiro. Peguem esse dinheiro, invistam-no em outro lugar! Talvez tenham a sorte de conseguir empregá-lo produtivamente. Se acontecer isso, vocês criarão novos empregos, promoverão a economia e, se Deus permitir, terão ganho uma "graninha". Se alguém pedir ajuda, respondam que já deram. Por falar nisso, gosto de que me chamem Larry, o Liquidador. Sabem por que me agrada meus amigos acionistas? Porque ao meu enterro vocês irão sorrindo e com gaita no bolso. Será um enterro que valerá o céu.

Larry ganha no final.

Ainda hoje, muitos educadores pregam o investimento em ações como uma atitude de fé na sua capacidade de sobreviver e crescer sempre ao longo dos anos. Mas toda empresa tem o seu ciclo de vida. O investidor deve, antes de tudo, procurar preservar o seu capital, não a empresa onde investe.

Hoje, a margem de segurança é um conceito muito empregado no processo de compra de boas empresas. O preço já não é definido a partir do valor de liquidação da empresa, mas de sua capacidade de gerar renda futura, a partir do Fluxo de Caixa Descontado, Análise Comparativa de Indicadores ou Análise Gráfica. Mas uma coisa não mudou: nós compramos ações para ganhar dinheiro.


quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Qual o preço justo da VALE3?


Existe meia dúzia de planilhas que podem ser utilizadas para fazer o valuation da VALE3. O problema é que os resultados obtidos variam consideravelmente, indo de R$ 30,00 até R$ 90,00. Recentemente um grande banco anunciou que a VALE3 no final de 2019 terá o preço justo de R$ 72,00. Hoje ela está em torno de R$ 50,00. O problema de qualquer valuation de VALE3 reside no fato de que ela é uma empresa cíclica, que acompanha a evolução da economia, brasileira e global. Qualquer valuation dela é impreciso. 

Usando o tradicional método do Fluxo de Caixa Descontado, o valor obtido é R$ 57,56. Apesar de muito próximo dos valores atuais, ainda existe um alto grau de imprecisão. Então, como calcular o valor justo da VALE3? Simples: através de um gráfico de longo prazo, que não deixa de ser uma forma de valuation.


terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Bolsa é investimento de longo prazo

Um dos três livros mais importantes sobre ações escritos no Brasil é o do Alexandre Póvoa, "Valuation, Como Precificar Ações".

Lá no final do capítulo 1, existe uma parte denominada "Cuidado com os Jargões Famosos". Reproduzo:

"Já o jargão de que "A bolsa é um investimento de longo prazo" não pode ser aceito como simples regra. Um bom exemplo na história é o mercado japonês que perdeu muito valor desde o iníco dos anos 90, quando a economia nipônica começou a sua derrocada. Imagine se algum gestor de recursos tivesse acomselhado o tal longo prazo para um japonês no início dos anos 90, e que este houvesse investido mil ienes em um fundo de ações. Ao fim do mês de julho de 2011 (21,5 anos depois), o mesmo investidor teria apenas 320 ienes em sua conta (uma perda de 68% do total investido)"

Posso dar uma atualizada no livro: em 1990 o índice Nikkei estava em 27.000 pontos (mas em 1989 chegou aos 39.000 pontos, ou seja, não era topo). Estamos no final de 2018 e quase 30 anos depois o índice Nikkei está nos 21.230 pontos. Depois de 30 anos o nosso investidor continua no prejuízo.

sábado, 24 de novembro de 2018

CIEL3: uma abordagem fundamentalista


Os gráficos da CIEL3 mostram um topo duplo desde 2015/2016. Para quem segue a AT, estava claro a tendência de queda. Mas, muitos que usam a análise fundamentalista se recusaram a aceitar que uma empresa altamente lucrativa, com excepcionais indicadores, possa estar com uma tendência de baixa. Então, vamos mostrar porque também na AF a tendência era de queda desde 2017.

Primeiramente é importante distinguir indicadores de fundamentos. Os indicadores mostram o passado, eles, isoladamente, não apontam o futuro. Para sabermos para onde vai a CIEL3 vamos usar a técnica do valuation. O grande mestre do valuation é Aswath Damoradan. Vamos empregar o método de Damoradan para indicar o valor justo de CIEL3 em meados de 2017. Para isso usamos os dados do primeiro semestre. O resultado é um valor justo de R$ 12,43. Neste momento a CIEL3 era negociada a R$ 25,00.

O modelo de Damoradan pode levar a algumas inconsistência porque trabalha com os dados mais recentes. Não recorrentes podem afetar o valor. Para corrigir isso, é feito uma normatização, que pode ser pela média do lucro ou pela média do ROE dos últimos anos. Com a normatização, usando a média do ROE dos últimos 3 anos, o valor justo subiu para R$ 16,44, ainda muito baixo em relação ao preço de mercado da época. Isso por si só já apontava para uma queda do ativo.

Agora vamos fazer o valuation no 3º trimestre de 2018, usando os mesmos critérios. O resultado foi um valor justo de R$ 9,37. Com a normatização esse valor subiu para R$ 9,68. Portanto, em linha com o preço atualmente negociado no mercado, indicando um fim do período de quedas.

Por que o valor justo de CIEL3 caiu tanto?

1 – Queda do ROE, de 35% em 2015 para 24% em 2018;

2 – Queda na taxa de retenção:  quando temos aumento de dividendos numa empresa maratonista (que não é de crescimento), é um ótimo sinal. Mas quando se trata de uma empresa de crescimento, aumento de dividendos significa diminuição de lucro retido, que é a fonte para novos investimentos necessários para a manutenção do crescimento;

3 – Redução da taxa de crescimento recente: desde 2017 o crescimento do PL é pífio.

4 – Queda no lucro, em relação a 2017, com perspectivas de novas quedas no lucro nos próximos trimestres.

Os valuations de CIEL3 já apontavam queda desde 2015, quando o ROE consolidou uma tendência de redução. A análise já indicava que a empresa, mesmo lucrativa, estava mudando de perfil, deixando de ser uma empresa de crescimento para uma maratonista. Isso não quer dizer que a empresa vai quebrar, mas que o mercado não vai mais pagar o "prêmio" pela espectativa de crescimento. 

O fato da empresa anunciar que vai elevar seu pay-out, ao mesmo tempo que admite que as margens deverão cair em função da concorrência, é algo preocupante. Uma empresa do porte da Cielo para se reinventar precisa de pesados investimentos, mas parece que prefere pagar dividendos. Esse é um erro já cometido por diversas outras grandes empresas do passado.

Hoje, o valor justo da CIEL3 está na faixa entre R$ 9,00 e R$ 10,00, sem perspectiva de recuperação.
Infelizmente, o valor de uma empresa não é definido pelo seu passado, com indicadores maravilhosos, mas pelo seu futuro. Um futuro lucrativo, mas sem crescimento, resulta num preço na casa dos R$ 10,00.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Indicações para o mês de dezembro 2016

Já faz um bom tempo que este blog faz mensalmente indicações de FII’s, apresentando uma carteira com objetivo de auferir rendimentos superiores ao IFIX. Esse objetivo foi alcançado com grande sucesso, poucas foram às vezes que o blog teve um desempenho igual ou inferior ao IFIX. Porém, para se obter tal desempenho, abre-se mão de se indicar pensando no longo prazo, preocupando-se somente com os próximos 30 dias. Não se muda o perfil do dia para noite, mas esperamos ter um compromisso menor com o desempenho de curto prazo e indicar mais aquilo que acreditamos.

Para o mês de dezembro incluímos mais dois fundos e retiramos SDIL11, que nos próximos meses sofrerá oscilações nos proventos, afetado pelo fim de descontos, multas e despesas. É um bom fundo, mas a economia não está ajudando. Hoje, é uma opção para quem quer comprar vacância.

BBBFI11B: estamos voltando a indicar esse fundo, que foi penalizado pelas notícias de contenções de despesas nos bancos públicos. É um fundo de risco mais elevado, mas não há perspectiva de aumento de vacância. O mais interessante é a possibilidade de mudança no regulamento, o que permitiria dar uma destinação as áreas atualmente desocupadas. Mas há a infernal burocracia da CEF, que exige voto via carta, com firma reconhecida e tudo mais. Mas mesmo que tudo dê errado, o que paga de DY já compensa.

CPTS11B: esse fundo fez uma grande subscrição, o que foi bom para reduzir o risco de sua carteira, que contém alguns CRI’s de empresas problemáticas. Contudo, não houve tempo para investir adequadamente o capital adicional, o que resultou numa queda significativa no valor dos proventos, de R$ 1,25 para R$ 0,81 em novembro. É algo que se resolve com o tempo: o valor a ser pago em dezembro já se elevou para R$ 0,90. Infelizmente, não se pode esperar muita lógica, racionalidade e coerência do mercado no curto prazo e o fundo sofreu uma queda, em novembro, de -7,65% (não considerando os proventos). A tendência é que o valor dos proventos se normalize, talvez num patamar talvez abaixo do que registrava anteriormente, com o valor da cota também se ajustando à taxa de juros mais baixa. E com a melhoria do perfil da carteira de CRI’s, a tendência é de redução do prêmio exigido do fundo, o que se daria com uma elevação no valor das cotas.

BMLC11B: mantivemos. Esse fundo apresenta oscilações nas distribuições mensais. A queda ocorrida no mês de novembro repete o movimento ocorrido em 2015. Há uma elevação da vacância, mas é algo pouco significativo.

FIIB11: registrou uma boa alta em novembro, mas o valor dos proventos também subiu. Bom fundo.

XPCM11: houve aumento nos proventos, de R$ 0,75 para R$ 0,78, resultado do reajuste da parte atípica. Continua mais um mês na nossa carteira.

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Desempenho das indicações do mês de novembro

Acabou o rali do IFIX, pelo menos por enquanto. Seu inicio se deveu a recuperação da queda sofrida com a possível tributação dos FII’s. Nos últimos meses, a perspectiva de redução rápida dos juros (SELIC) deu folego à alta dos fundos. Agora, sabe-se que a queda da SELIC será lenta e sujeita a percalços. Isso ajudou a trazer os FII’s para a realidade. Neste mês de novembro, o IFIX teve uma queda de -2,59%. Pesou a especulação envolvendo fundos de agências bancárias e o péssimo desempenho de alguns fundos de papel (mais por uma interpretação errada do mercado, que prova não saber precificar no curto prazo).

Já o desempenho das indicações do blog foi mais uma vez superior ao IFIX. Se o índice amargou uma queda que determinou o fim do rali, as indicações do blog renderam um ganho de +2,28%. Apenas uma indicação não teve um desempenho excepcional.

BMLC11B: único fundo indicado com desempenho negativo:  -2,4%. Pesou a redução dos proventos;

FIIB11: apesar da baixa liquidez, registrou uma alta de 6,2%;

SDIL11: alta de 4,3%. Mercado percebeu que tinha precificado errado;

XPCM11: nossa velha conhecida continua seu rali: alta de 1,1%. Para essa serve a frase  “os cães ladram e a caravana passam”.



segunda-feira, 31 de outubro de 2016

FII's: Indicações para o mês de novembro

Após o rali do mês de outubro, a maioria dos fundos está com preços elevados, antecipando uma provável queda dos juros. Observa-se a presença de muitos investidores novos, que compram fundos festejados, estimulados por gerentes de bancos e agentes de corretoras. Sobra pouco ainda com preço atrativo. Neste mês optamos por fazer duas trocas. Tiramos CPTS11B, que em função do baixo provento anunciado tende a sofrer uma desvalorização. É algo passageiro, que vai se resolver quando o fundo aplicar os recursos captados (será uma boa opção de compra se a cota de fato cair). Outro que estamos tirando é o JSRE11, aqui em função da gestão. Para o lugar desses dois fundos escolhemos dois belos empreendimentos: FIIB11 e SDIL11.

BMLC11B: mantivemos a indicação. Bom fundo, com alguma vacância, opção conservadora;

FIIB11: trata-se de um condomínio industrial, localizado em Joinville, ocupado por dezenas de empresas, a maioria do setor metal-mecânico. Possui uma vacância relevante, com constante entrada e saída de inquilinos. Para os próximos meses, a gestora prevê uma queda nos proventos, já precificado pelo mercado. Neste mês de novembro o DY está em 0,89%a.m., um valor muito elevado;

SDIL11: centro logístico localizado no Rio de Janeiro, próximo ao aeroporto do Galeão. Composto por vários módulos, possui uma vacância significativa. A maioria dos módulos está alugada para a BR Foods, que, provisóriamente, obteve um desconto no valor do aluguel. Se alugar os módulos vagos, essa dependência da BR Foods pode se reduzir significativamente;

XPCM11: mesmo com toda a alta recente, o preço ainda é razoável.

FII's: Resultado das indicações de outubro

As indicações do blog renderam em outubro 3,88% de lucro. O IFIX no mesmo período subiu 3,85%. Um empate. Os FII’s continuaram subindo, tendo como única justificativa uma provável queda acentuada na taxa de juros. Não é o que o BCB está sinalizando: a queda deve acontecer, mas num ritmo suave. Mesmo assim, as cotações continuam subindo, alimentadas pela entrada de novos investidores, estimulados pelas constantes matérias na imprensa exaltando o bom momento dos FII’s. Isso não é bom. Analisando as indicações do blog:

BMLC11B: sem sustos, subiu 5,4% no mês, (incluindo os proventos). Bom fundo.

CPTS11B: subiu 3,3% no mês, mas  poderia ser mais se o anúncio, decepcionante, dos proventos não tivesse ocorrido no meio do último pregão do mês. O baixo valor anunciado está relacionado à subscrição e a necessidade de se incluir na repartição dos lucros as novas cotas. É uma situação que tende a se normalizar com a realização dos investimentos com os recursos captados. Por enquanto, deu um susto.

JSRE11: uma queda de 0,19% que afetou o desempenho do blog. Conservadorismo tem limites. A gestora resolveu manter boa parte dos recursos aplicados num fundo de renda fixa. Isso não é conservadorismo, é pura incompetência.

XPCM11: agora o fundo virou queridinho. Repetem os argumentos que usamos desde o início do ano. E como muitos investidores seguem qualquer conselho, a cota continua subindo como um foguete: 6,9% em outubro (41% desde o início de maio).